sexta-feira, março 15 2024

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[contém pequenos spoilers] O ano é 1900. A medicina começa a dar os passos mais avançados em termos de diagnóstico e cirurgia na proeminente Nova York. Liderada pelo Dr. John Thackery (Clive Owen), a equipe de médicos do hospital Knickerbocker no Harlem em Nova York, está no epicentro de novas descobertas possibilitadas pela revolução industrial e abertura de mercados numa sociedade que ainda não aboliu costumes monárquicos e apresenta problemas sociais devastadores.

Criada por Jack Amiel e Michael Begler e totalmente dirigida por Steven Soderbergh, The Knick traz nos 10 episódios que compõem a primeira temporada uma história envolvente, relevante e pungente. A produção de época é impecável, desde os figurinos à majestosa cenografia, que permite uma imersão completa e inquestionável naquele universo. Além disso, o comando de Soderbergh na direção elétrica (com câmeras sempre à mão e iluminação baixa) traz às realistas cenas cirúrgicas uma sensação de imediatismo e de “imperfeição”, como a própria medicina que estava sendo exercida naquela época.

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A trilha sonora eletrônica é um espetáculo à parte, que faz um contraponto interessante com a época ao mesmo tempo em que emula o ar de “modernidade” que estava sendo vivenciado pela sociedade daquele tempo. Thackery é um cirurgião determinado e disposto a aplicar em pacientes seus conhecimentos e novas técnicas aprendidas com colegas da área, sem preocupação com questões éticas, morais e regulatórias que eram praticamente inexistentes. Por isso, não é apenas chocante testemunharmos um médico notoriamente operando sob o efeito narcótico da cocaína, como também constatar que a substância era tanto administrada em pacientes como analgésico e facilmente disponível nas prateleiras das farmácias locais.

Mas mais do que uma série que se propõe simplesmente apresentar casos complicados e recriar (com precisão histórica) as rudimentares condições de salas cirúrgicas do início do século XX, The Knick é um drama que se envereda a discutir questões sociais como o racismo e a discriminação contra mulheres de forma totalmente aberta e desprovida de pudores e eufemismos. Assim, é curioso (e ao mesmo tempo triste) notar que as cenas que mostram pessoas de cor sendo segregadas, xingadas, agredidas e humilhadas – como por diversas vezes acontece com o brilhante cirurgião Dr. Edwards -, não só retratam o quão socialmente aceitável era aquele comportamento na época, mas ainda contrasta com a nossa realidade. O baque vem quando percebemos que, mais de um século à frente, nossa sociedade ainda exibe estes comportamentos em diversos locais no mundo.

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Sutilmente, mas sem nunca fugir do mérito, The Knick traz ainda uma discussão sobre a dependência química. Thackery é um viciado e somente quando a cocaína se torna escassa por causa da guerra é que seu comportamento passa a ser um problema a ser administrado. Além disso, o drama exibe as práticas e descobertas sempre alinhado a fatos, como a chegada do Raio X (que demorava uma hora para ser feito e sem nenhuma proteção), as evoluções em termos de diagnóstico e tratamento e comenta sutilmente como a industria farmacêutica era praticamente “livre” para introduzir tônicos milagrosos endossados por grandes nomes da área  e até mesmo drogas ilícitas fabricadas por laboratórios hoje conceituados. E, sim, a Bayer sintetizava e vencia a heroína como uma das formas de tratar a dependência química da cocaína (como vimos na cena final) e psiquiatras utilizavam métodos bárbaros em seus tratamentos, como arrancar todos os dentes e alguns órgãos acessórios de pacientes com problemas mentais em busca da cura.

Em meio a isso, a narrativa fluida ainda traz casos interessantes que são desenvolvidos em paridade com os personagens. Temos o romance de Cornelia, uma jovem “prometida” em casamento com um rico herdeiro, e o médico negro; a freira que passa a realizar abortos clandestinos, pois não aguenta mais ver recém-nascidos morrendo devido ao abandono e a singela dedicação da enfermeira Lucy ao seu viciado mentor. São 10 capítulos que trazem um primor de produção que hoje está cada vez mais escasso na TV graças ao cuidado absurdo de cada aspecto desta grandiosa série. The Knick certamente é o dramas mais excepcional desta temporada e um must see para fãs de séries e de uma grande história.

5star

The Knick é exibida no Brasil pelo canal Max todas as sextas às 21h e os episódios da primeira temporada estão disponíveis via HBO GO e HBO On Demand para os assinantes. Recomendada em grau máximo! Assista e me agradeça depois ;)

12 comments

  1. Foi provavelmente o corretor que sacaneou. Mas aclive owen me fez rir.

    No demais estou doido pra ver essa série

  2. The Nick ao lado de True Detective são as séries 2014!

  3. Putz… Excluí os episódios que eu tinha no computador porque teve gente (da crítica, não qualquer um…) falando que não era tudo isso… Mas agora quero ver de qualquer jeito! Valeu, Bruno!

  4. Vou confessar: morro de medo de sangue e a série só me chamou a atenção pq sou fã do U2 e soube que a Eve Hewson, filha do Bono,e que faz a enfermeirinha Lucy (bem da pá virada, aliás srsrs), estaria nela. Mas desde o primeiro cap. eu me apaixonei ( e até reconheci o ator que fez o dr. Leeky em Orphan Black)… é uma série medonha de boa, e já tô trite pq a 1ª temp. acabou!

  5. Ficou boa, ainda mais sabendo que foi escrita em dispositivo móvel. Outra correção: “a Bayer sintetizava e venDia heroína”

  6. A série é sensacional, aguardando a segunda temporada. Incrível como é mostrado qual rústico ainda eram as cirurgias naquela época. Tem momentos que viro o rosto pra não ver :s

  7. Então, passando aqui só pra agradecer a dica! Série muito foda!

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