quinta-feira, abril 18 2024

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De todas as coisas de Westworld que me impressionaram em seus cinco primeiros episódios, a eficiência com que a produção da HBO imprimiu dubiedade e dualidade não só ao comportamento de muitos de seus personagens, mas principalmente à sua própria narrativa é certamente uma característica digna de nota. Afinal, para uma série que tem no mistério um de seus elementos mais proeminentes – ainda que não necessariamente o central -, duvidar e principalmente questionar e refletir sobre o que nos é dito e mostrado ajuda a criar uma atmosfera que pro espectador é (ou deveria ser) mais instigante.

Nesse contexto, se já ficou evidente que é tolice definir motivações e comportamentos dos personagens além dos próprios rumos da história como sendo preto ou branco (o homem de preto de Ed Harris até aqui, por exemplo, dependendo do ponto de vista pode ser visto tanto como vilão quanto mocinho na trama), também já é um fato que a série comandada pelo casal Jonathan Nolan e Lisa Joy faz bem em apostar na  área cinzenta – onde algo ou alguém trafegue sempre entre o bem o mal; o certo e o errado; o moral e o imoral – como alicerce para o desenvolvimento da narrativa, como o ator Rodrigo Santoro nos contou nessa entrevista.

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E a razão para essa escolha me parece até simples: fica mais fácil criar identificação do espectador com o personagem X, Y ou Z, quando estes, humanos ou não, são apresentados como figuras tridimensionais, complexas, curiosas e… falhas. Sim, porque por mais que a aparente onisciência e onipotência do excêntrico Robert Ford sobre tudo no mundo criado por ele chame mais atenção (e a conversa que ele trava com Theresa Cullen na cena do almoço do quarto episódio é um baita exemplo disso), é sua natureza dúbia e o mistério que ela desperta – também uma característica marcante de Bernard, diga-se – que transforma o personagem em alguém de fato interessante.

E se Westworld é rica nesse aspecto, também o é na capacidade de fomentar teorias, comparações com outras obras, referências e, principalmente, de plantar a dúvida sobre a própria linearidade que sugere para a sequência de eventos da trama. Com isso em mente, me parece que a montagem dos episódios até aqui tenta intencionalmente criar a impressão de que estamos vendo todas as histórias (o despertar de Dolores e Maeve; a chegada de William ao parque; a busca do homem de preto pelo labirinto etc) acontecendo paralelamente quando na verdade pode haver uma separação temporal entre todas elas.

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Se assim for, podemos estar perto de ver algumas respostas para o mistério que envolve o tal incidente mencionado ainda no primeiro episódio da série (e que muito provavelmente tem a ver com Arnold, a provável voz que Dolores ouve); esclarecer de uma vez por todas se William e Homem de Preto são ou não a mesma pessoa (ainda tendo a crer que sim) e até mesmo se as conversas/análises entre o time da Delos e os anfitriões ocorrem necessariamente e imediatamente após cada um dos eventos que vemos no parque, visto que se assim fosse, o aspecto imersivo das histórias que os visitantes experimentam seria afetado (William, por exemplo, não notaria nesses dois episódios os seguidos “sumiços” de Dolores?).

Seja lá como for, muitas informações e ideias importantes já nos foram dadas nesses Dissonance Theory e Contrapasso. Assim, se no quarto episódio Bernard sugere, durante a conversa isolada que tem com Dolores, que o labirinto pode representar a chance de liberdade para a mente curiosa da anfitriã, no quinto vemos Ford, ao contar a história do dia em que soltou seu cão no parque, concluir, de forma análoga, que a tão sonhada liberdade ou a chance de se livrar de uma coleira (e pros anfitriões o loop narrativo não deixa de ser a coleira à qual estão submetidos) nem sempre pode ser algo bom visto que isso traria confusão e perda de propósitos.

Outro aspecto curioso também reforçado por estes dois episódios: o conceito de que as histórias e, por consequência, o jogo ganham um caráter mais intenso (e talvez até mais perigoso) à medida em que o visitante “mergulha” mais fundo no parque. Aliás, é divertido ver como Westworld às vezes faz questão de abraçar a ideia de ser um game ao mostrar um visitante como Logan (o cunhado de William), por exemplo, comemorando a aquisição de um upgrade de arma numa cena do quarto episódio para encarar, já no quinto episódio, a inédita experiência de ser atacado fisicamente por anfitriões além, claro, de vislumbrar uma dificuldade bem maior para evoluir nos desafios que até então encarava como “simples” diversão.

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Agora, dos mistérios mais evidentes que a série apresentou até aqui, Arnold foi sem dúvida o que ganhou mais destaque nesses dois capítulos. Aliás, é notável como a série conseguiu valorizar um personagem, fazendo com que nos importemos com sua história, mesmo sem ainda tê-lo mostrado de fato. Afinal, Arnold é alguém real ou apenas uma ideia lançada por Ford para criar o mito de um antagonista? E se for real, foi ele que escondeu dispositivos nos anfitriões (como o que Elsie encontra sob a pele de um deles e que Dolores também parece ter) como uma forma de controlá-los ou pelo menos de estabelecer uma comunicação com eles, ou seriam esses dispositivos apenas ligados a algum tipo de espionagem industrial?

Sim, Westworld tem sido pródiga em fazer mais perguntas do que em respondê-las até aqui, mas o despertar aparentemente definitivo de Maeve introduzido no quarto episódio e reforçado no final do quinto, aliado aos acontecimentos da história de Dolores – que ao se afastar do seu loop que nos fora apresentado até então cria uma situação muito bem-vinda de empoderamento da personagem (ela não só deixa de ser a donzela em perigo precisando ser salva como ainda por cima aparece salvando William não uma, mas duas vezes) – parece indicar uma boa virada na trama já a partir do próximo episódio.

Intrigante, instigante e épica, a série segue impressionando e a cada semana refazendo um salutar convite para cada um de nós: vamos todos, tal qual Dolores, imaginar uma história em que não precisamos mais ser apenas espectadores passivos da obra?

5stars

13 comments

  1. O último episódio (5) foi tão chato e lento que quase durmi. Só o final salvou.

  2. Um ponto que fico em dúvida sobre a linearidade e a questão Homem de Preto x William foi a introdução do Wyatt. Se ele está a tanto tempo indo ao parque, nunca teria ouvido sobre Wyatt? Acho seguro afirmar que a busca de Dolores pelo labirinto está ocorrendo enquanto ela está com o Willian. Sendo ele o Homem de Preto, levaria então algo em torno de 40 anos para ele descobrir a existência dessa parte do jogo? E como no primeiro episódio o Homem de Preto encontra Dolores ainda presa em seu loop, se for passado o que vemos na aventura dela com William quer dizer que ela foi totalmente reprogramada e não atingiu o seu objetivo. Claro que nesse aspecto, justificaria William não saber do Labirinto, pq Dolores nunca chega lá…

  3. Concordo plenamente! Foi bem chatinho mesmo, aquela história do El Lazo zzzz

  4. Deve ser pq as duas histórias têm o dedo do Jonatan Nolan

  5. O Wyatt é parte da nova narrativa do Ford!!
    (Pense como sendo um “DLC” nova na história

  6. Depois de assistir aos dois episódios, e principalmente ao quinto, me senti como que chacoalhado em minha poltrona em frente ao computador. Impressionante a virada que Dolores e William tiveram no quinto episódio. De deixar qualquer um tonto…

  7. Muito bom!! Ainda não tinha percebido a possível descontinuidade temporal dos acontecimentos, e faz bastante sentido! Excelente série e crítica!!

  8. Não. Quero um episódio que não me faça dormir. E isso não tem nada a ver com ação.

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