quarta-feira, março 27 2024

theamericans

The Americans esta encerrando sua terceira temporada esta noite na TV norte-americana (já foi renovada) e, se você ainda não vê, está perdendo um dos melhores e mais tensos dramas atuais. Uma grande vantagem da série é unir características que agradam públicos distintos. Ela ao mesmo tempo é de gênero (um thriller de espionagem), drama familiar e TV “de qualidade” (no sentido de que há um cuidado técnico, de narrativa, de encenação do drama, superiores às necessidades de um programa serializado). E funciona maravilhosamente em todos os sentidos.

Uma sinopse básica e com alguns spoilers a partir deste ponto: início dos anos 80, Elizabeth (Keri Russel, Felicity) e Philip (Matthew Rhys, Brothers & Sisters) são espiões da KGB que se passam por casal americano de classe média, morando nos subúrbios de Washington, tão bem infiltrados porque se casaram e vivem assim há mais de 15 anos, inclusive com dois filhos. As coisas se complicam com a chegada de um novo vizinho, Stan, agente do FBI que se muda para a cidade justamente no departamento encarregado das questões com a União Soviética. A série acompanha as missões do casal em paralelo com as investigações do FBI, que consistem em grampos, recrutar aliados no meio inimigo e conseguir as mais diversas informações usando os mais variados disfarces com as melhores perucas da televisão.

Como thriller de espionagem, The Americans adota uma estética muito própria da época em que sua trama se passa: é de tom naturalista, uma encenação mais clássica com duração maior dos planos e tensão criada a partir de uma gramática básica de montagem, mas muito eficaz (o finale da primeira temporada, por exemplo, é praticamente o clímax de Argo estendido por 45 minutos). Apesar de cada episódio ter sua boa dose de ação e suspense, a estrutura geral das temporadas é de uma história que pacientemente se desenvolve com recompensas maiores ao final, algo que recentemente Boardwalk Empire era quem melhor fazia. Junta-se a isto o fato de que estamos no período da Guerra Fria, o clima de paranoia é bem captado, e há um prazer extra em acompanhar aventuras dependentes de uma tecnologia arcaica mas que avança a passos largos.

TheAmericans

A série não se preocupa muito em negociar (ou mesmo provocar) a relação do espectador com os protagonistas pelo fato de estarem “do lado errado” da História. É uma série americana, com mocinhos que acreditam na América como um Mal que deve ser extirpado e um suposto “vilão” que na verdade está do lado da lei, mas isto raramente está em jogo. Não há uma fetichização do “criminoso”, seja como é feito nos filmes de gângsters, seja numa tendência da TV na última década (de The Sopranos a Breaking Bad, passando por Dexter etc). Na verdade, é Stan quem inicialmente passará pelos conflitos morais mais pesados, enquanto os protagonistas são retratados sem heroísmo e numa frontalidade condizente com a realidade em que vivem: matar um inocente que sabe demais faz parte do trabalho, assim como fazer sexo com o alvo ou alguém de interesse futuro.

O que muito interessa a The Americans, no entanto, é narrar um drama familiar dentro desta trama de espionagem. Na primeira temporada, na verdade, há uma história de amor sendo contada, mas que inverte a ordem típica: ao invés de termos duas pessoas que se conhecem, se apaixonam e se casam, o que temos é duas pessoas que não se conhecem, se casam e só depois de 15 anos se apaixonam. E o que temos a seguir é um desenvolvimento natural dos problemas: filhos. Uma série como esta costuma ter dificuldades em lidar com filhos dos personagens (o exemplo recente mais evidente é Homeland em suas primeiras temporadas) e, de fato, The Americans peca um pouco nisso no seu primeiro ano. Mas ao focar na família, a série conseguiu dar peso dramático à relação do casal com seus filhos sem deixar de ser diretamente relacionado à trama principal. Um exemplo recente que mostra esse talento: Paige, a filha mais velha, diz à mãe que acredita que seu pai está tendo um caso, o que justificaria as ausências noturnas; a mãe, que obviamente sabe que o marido está em uma missão, garante que não há caso algum, e Paige retruca de forma triste e bastante verdadeira “Você e papai cuidam um do outro… mais do que de nós”. É o tipo de cena que diz muito sobre os personagens, a dinâmica entre eles, o impacto que este trabalho específico tem em suas vidas particulares.

E é impacto o que não falta na série. Não só os principais, mas há uma galeria de personagens coadjuvantes muito bem construídos e que são profundamente afetados pelos acontecimentos, não só em termos de roteiro, sempre bem amarrado e empolgante, mas também na caracterização sempre elegante e grave dos atores (uma das aquisições da nova temporada é Frank Langella, que diz muito com um olhar ou entonação e postura de voz) e na encenação sempre inteligente e que não se permite afetação. O mais impressionante é a evolução a cada temporada, com o nível ainda maior neste terceiro ano, levando os personagens a conflitos e situações desconfortáveis mesmo com toda a experiência e habilidades que possuem (um flashback de Philip sobre como foi seu treinamento sexual é um dos inúmeros momentos memoráveis que a série trouxe este ano).

Um dos trunfos da série, aliás, é um domínio completo do material que se tem em mãos, a sensação de que tudo está sob controle, que os autores sabem o que estão fazendo, entendem os seus personagens e para onde eles vão; há criatividade e inteligência que estão a serviço do drama, sempre buscando a melhor forma de filmar pra que o ótimo material seja empolgante, pra que a ação seja excitante e o drama seja verdadeiro. Talvez um dos segredos seja a paciência: são muitas missões e muitas situações com potencial de desenvolvimento que são lançadas ao longo dos episódios, que têm função imediata (seja temática ou apenas servindo ao suspense), mas também que terão relevância bem mais à frente. Não há urgência em concluir nada e tudo se acumula e dá volume e profundidade aos envolvidos. Na segunda temporada houve um sentido de unidade, mas as ambições foram tão maiores este ano que tudo indica que muitas coisas ficarão pendentes. E isso pouco importa, porque no fim nos vemos com todas as atenções voltadas para o que está acontecendo, admirando os desdobramentos e querendo mais.

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7 comments

  1. O season finale de quarta foi excelente e a cena final arrepiante. Tenho tentado indicar a série para outras pessoas mas ela continua a ser ignorada pela maioria. Pessoalmente acredito que esteja entre os melhores dramas televisivos atuais, porém falta um status de premiação (como aconteceu com BrBa, que só virou hype perto do final). Suponho que o próximo Emmy premiará a temporada final de Mad Men (com méritos) mas espero que The Americans seja, pelo menos, indicada, pois não vejo tantas outras séries melhores por ai. Se pensarmos que até Homeland, que é inferior, conseguiu um grande hype nas primeiros temporadas fica difícil entender o motivo dela ainda continuar fora do radar da maioria…

  2. Comecei a assistir sem maiores pretensões e fui fisgada, vi as 3 temporadas num fim-de-semana e agora é sofrer esperando pela quarta, só em 2016. Série excelente, roteiro bem armado, ação na medida certa, personagens bem desenhados, e o mais estranho: a dupla central comete barbaridades e mata pessoas num piscar de olhos, qualquer coisa pode ser feita visando cumprir suas missões, seguindo o mandamento principal de Maquiavel: os fins justificam os meios. E, no entanto, amamos aquele casal! Dá pra entender esse paradoxo?

  3. Alguém saberia me dizer por gentileza o nome da imagem do soldado sorrindo com uma bandeira da frança que aparece na abertura do seriado?

  4. Acabei de terminar a segunda temporada. COMO FAÇO PARA ASSISTIR A TERCEIRA???
    Pra mim, The Americans é uma das melhores séries dos últimos tempos. Eu acho difícil ser indicada a prêmios porque eles tratam de assuntos muito delicados para a suposta supremacia americana. Mostram que os americanos não eram os mocinhos, como sempre quiseram passar e que nos dois lados existiam pessoas capazes de tudo para chegarem ao objetivo. Passam ainda que os russos eram mais sinceros, comprometidos e organizados. Também tinham um compromisso muito maior com a palavra dada.

  5. Vou começar a assistir a série hoje e já tenho certeza que vou gostar muito!

  6. Estou vendo muita gente falar bem, é chata ! pobre ! sem criatividade, cenas previsiveis e manjadas, nada genial ! a falta de brilhantismo já é notada no primeiro capitulo piloto, quando o agente do FBI entra na casa do espião russo, e o espiao russo (disfaçado) vai pegar um cabo emprestado no carro, no mesmo carro onde tem um sujeito sesquestrado , ele abre a porta do corro e pega o cabo enquanto o agente do fbi vem em sua direção, na boa ! isto jamais aconteceria na realidade ! tentativa chula de causar suspente (que nao causa), isto não prende agente ..porque precebe-se que esta forçando a barra, e assim se arrasta até o fim…insuportavel

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