sexta-feira, março 29 2024

“Mas os tempos devem mudar, e eu também” Essas foram as palavras que o Doutor disse há alguns anos, quando estava prestes a se regenerar mais uma vez. E embora essa frase resuma a essência de Doctor Who, ela nunca se encaixou tão bem como no atual momento. Durante 55 anos, Doctor Who seguiu a premissa do Time Lord, metade palhaço, metade messias, viajando dentro da sua TARDIS pelo espaço e tempo, convidando pessoas de toda a galáxia para descobrirem as maravilhas do universo com ele, e sempre salvando o dia. Quando o Doutor morria, a regeneração lhe dava uma nova vida, um novo rosto, e uma nova personalidade. No decorrer de 55 anos, ele foi interpretado por 12 grandes atores, sobrevivendo a um cancelamento no final dos anos 80, uma tentativa fracassada de retorno nos anos 90, e um reboot bem-sucedido no século 21.

Agora estamos em 2018, e o personagem mudou novamente. À convite do Crackle, que passará a exibir a série no Brasil, assistimos em primeira mão o episódio de estreia desta 11ª temporada da nova era. Como sabemos, o viajante do tempo ganhou uma encarnação feminina: Jodie Whittaker (Broadchurch, Black Mirror) assume o comando da TARDIS após a iteração de Peter Capaldi por quatro anos. E uma mudança tão importante quanto ocorre por trás das câmeras: Steven Moffat (Sherlock) deixa o reinado da série após seis temporadas e passa o bastão para Chris Chibnall (Broadchurch). Tudo mudou, e ao mesmo tempo, parece que nada mudou. E isso é bom.

Assim como “Spearhead From Space” (estreia do Terceiro Doutor na série clássica), “Rose” (o retorno de Doctor Who após 16 anos de hiato) e “The Eleventh Hour” (a estreia de Moffat como showrunner em 2011), este “The Woman Who Fell to Earth” funciona perfeitamente para os não-iniciados que nunca assistiram a um único episódio das 36 temporadas anteriores. Mas os whovians de carteirinha perceberão que Chibnall fez de tudo para torná-la diferente da Era Moffat (da mesma maneira como este fez de tudo para se distanciar da fase de Russell T. Davies): nova Doutora, novos companions, uma nova versão da música-tema, um novo logo, e definitivamente, uma nova atmosfera.

Desde a sua primeira aparição, Whittaker abraça a personagem com uma segurança invejável, como se já estivesse interpretando-a há anos. À primeira vista, ela não remete a nenhum dos Doutores anteriores (o 11º Doutor de Matt Smith, por exemplo, era claramente inspirado no Segundo Doutor de Patrick Troughton), mas logo percebemos que a essência da personagem já está ali. A 13ª Doutora é carismática, simpática, divertida e adorável, sem traços da arrogância e rispidez do Doutor de Peter Capaldi mas, acima de tudo, ela demonstra a mesma confiança, determinação, seriedade e compaixão, quando é necessário. Eu estou muito interessado em ver novas facetas dessa encarnação do Doutor no decorrer das semanas.

A respeito do trabalho do novo showrunner, Chibnall adota uma abordagem bem mais sombria comparada com a Era Moffat: tudo tem uma atmosfera mais séria, mais madura, mais sci-fi e menos fantasia, sem as piadas ou alívio cômico que Moffat usava frequentemente (elas ainda estão ali, mas em doses menores). O visual do episódio (cuja maior parte se passa à noite) é, sem duvida, ainda mais cinematográfico comparado com os seus antecessores, e a trilha sonora do novo compositor Segun Akinola (que assume a tarefa ingrata de substituir Murray Gold após 12 anos) também segue a abordagem mais sci-fi e misteriosa. Os novos companions são muito interessantes e trazem calor humano para a trama, que é bastante contida e simples (apesar de perder o ritmo em alguns momentos), o que pode ser um alívio para quem já estava ficando cansado da complexidade (as vezes, desnecessária) dos roteiros de Moffat.

A Doutora está aqui, e convida a todos nós para uma nova viagem na TARDIS. Pois parafraseando uma das suas encarnações anteriores… ela é a Doutora, quer você goste ou não.

Doctor Who estará disponível pelo serviço de streaming Crackle a partir deste domingo, 7 de outubro.

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